Presidente da Câmara Municipal de Lagoa José Inácio Marques garante que, apesar da crise e da redução de custos, o futuro da FATACIL não estará em risco e lamenta existirem leis a contribuírem para afastar investidores e turistas do Algarve. Nesta entrevista ao «barlavento» versando sobretudo a temática económica, o autarca arrasa a ação do Turismo de Portugal, «que tem abandonado o Algarve», e entende não ser na dependência daquele organismo estatal que esta região poderá cativar novos visitantes nos mercados internacionais. E deixa um aviso: «só com a regionalização o Algarve poderá sair da crise em que se encontra»
barlavento - Como vai ser a edição de 2012 da FATACIL? De que forma a crise condiciona o certame?
José Inácio Marques - O orçamento da FATACIL /2012 ronda os 750 mil euros. Isso representa uma redução de 250 mil euros. A área de exposição também foi reduzida, contando desta vez com 250 pavilhões. No campo de futebol do Grupo Desportivo de Lagoa, que não é propriedade da empresa responsável pela FATACIL, só estarão máquinas agrícolas e automóveis. Tal situação deve-se à redução de custos. Por outro lado, toda a animação voltará a ter lugar no antigo recinto deste certame, depois de os concertos com maior dimensão se terem realizado durante alguns anos no palco montado no campo de futebol. O regresso ao modelo anterior tem a ver com a necessidade da já referida redução de custos. Nesse sentido, a animação terá outro tipo de espetáculos, com custos mais reduzidos, embora mantendo artistas nacionais. A FATACIL cresceu durante anos porque o mercado económico assim o permitiu. Agora que o mercado se comprimiu bastante no Algarve, temos naturalmente de dar respostas em articulação com essa situação. Ao mesmo tempo, a nossa aposta em 2012 passou bastante pela promoção, utilizando para o efeito órgãos de comunicação social e os próprios artistas nos seus espetáculos.
b. - A qualidade do evento poderá estar em causa?
J.I.M. - Esperamos que a qualidade se mantenha e que o número de visitantes da FATACIL não reduza muito. Este certame conta com muitos visitantes oriundos de outras zonas do Algarve e de fora desta região. Temos de perceber qual a apetência dessas pessoas, que aqui se encontram de férias, para irem, ou não, à feira. Sabemos que muitos dos turistas também se contêm nos gastos. Perante essa situação, existe um grau de incerteza ao nível da FATACIL, mas procurámos que tal situação não tivesse influência na qualidade. Porém, vai ter naturalmente reflexos num tipo de atuações que o certame tinha, bem como ao nível das áreas, que são menores. Mesmo assim, insisto, procuramos que o produto na forma como se apresente mantenha o padrão de qualidade.
b. - Qual é o setor mais afetado, contando desta vez com menos expositores?
J.I.M. - O comércio é o setor mais afetado, registando uma quebra, até porque isso tem muito a ver como a atividade que se desenvolve hoje na região. A agricultura está muito focalizada no protocolo existente com a Direção Regional da Agricultura do Algarve. Já o setor do artesanato mantém-se sensivelmente na mesma situação de outros anos.
b. - A manter esta crise, o futuro da FATACIL poderá ficar em risco?
J.I.M. - Não. Temos é de fazer um esforço para manter este tipo de certames até porque se trata do maior existente no Algarve ao nível da atividade económica e não apenas em termos de gastronomia ou de animação. A FATACIL foi crescendo ao longo de 33 anos e por vezes até de forma muito rápida. Agora sente-se o reflexo dessa situação. Não gostaríamos que assim fosse. Mas não se perceberia que estando o Algarve numa situação económica difícil, bastando para tal ver a taxa de desemprego, 17,4 por cento, das mais elevadas do país com a forte quebra nas empresas ligadas ao sector imobiliário e da construção civil, este certame não se ressentisse. Todas as atividades que estão a montante ou a jusante daquela que tinha imenso crescimento no Algarve como é o caso da construção, têm naturalmente hoje reflexos em consequência da crise instalada no país, acabando por afetar as empresas. A FATACIL tem sido um reflexo da nossa sociedade nos bons momentos. Agora, também neste tempo de recessão, espelha a crise em que vivemos.
b. - Apesar da crise, é em certames de cariz económico que as autarquias devem apostar ou a solução passará por outras iniciativas?
J.I.M. - Não são os certames somente em si que resolvem o problema. A realização de muitos certames faria até com que uns esmagassem os outros. O nosso desejo é manter a FATACIL e penso que os outros municípios do Algarve farão um esforço para assegurar os eventos que já têm. Criar novos certames, acho que é uma aventura. Haverá emprego quando houver economia. Significa isto que a nossa principal atividade, que é o turismo, se não for bem promovida a nível internacional no sentido de garantir visitantes de outros mercados passará também por um período negativo. E aquilo a que assisto, hoje, é a alguma inoperacionalidade em termos da promoção turística externa. Não vejo que estejamos a ser ativos.
b. - O que se passa em concreto? De quem é a culpa?
J.I.M. - O problema começa logo no facto de a lei do novo enquadramento das entidades de turismo ter vindo a ser adiada. Só agora está em consulta pública e nem sabemos se irá resolver o problema. O Turismo de Portugal não está a seguir o bom caminho para promover o país e em particular o Algarve. De resto, até tem abandonado esta região. O único produto que temos verdadeiramente bem instalado em termos de atividade económica é a atividade hoteleira associada ao golfe. A agricultura, as pescas e as indústrias extrativas e as transformadoras foram esmagadas pela hegemonia total do turismo, o que acabou por ser negativo para a economia desta região. Houve muita gente a alertar para esse perigo e o próprio Plano Regional de Ordenamento do Território do Algarve (PROTAL) cometeu esse erro. Andou a discutir-se camas turísticas em vez de se discutir diversidade da economia e do uso do solo para a atividade económica. O que às vezes se pretende é classificar o solo para nele nada ser feito. Ou seja, o PROTAL tem uma perspetiva completamente imobilista, sendo totalmente desajustado da atual realidade económica do Algarve.
b. - Pode destacar exemplos desse desajustamento que considera existir?
J.I.M. - Por exemplo, se um indivíduo num centro de inspeções quiser ampliar o seu estabelecimento localizado numa zona do interior, tal não lhe será autorizado. A justificação é situar-se em meio rural e já ter excedido a área permitida. Este PROTAL veio restringir a área de expansão a um máximo de quinhentos metros quando o anterior não tinha esse limite. Por outro lado, em meio rural uma pessoa pode instalar um picadeiro, mas já não lhe é permitido construir estábulos para os cavalos, nem que seja para os turistas fazerem passeios, o que é absurdo. Temos um PROTAL completamente subjugado ao esquema do turismo, ignorando todas as outras atividades económicas noutros setores com a agravante de estes serem fundamentais para a diversidade do produto turístico. Se um empresário quiser edificar um hotel rural poderá fazer uma construção até dois mil metros quadrados. Mas, entretanto, se desejar aumentar o espaço de um armazém, por exemplo, tal não será consentido.
b. - Há leis que afastam investidores e turistas do Algarve com maior poder económico?
J.I.M. - Acho que sim. Mas se não os afastam, também não os cativam. E por outro lado, enquanto a Administração Central não levar a efeito a regionalização, os municípios sozinhos não terão capacidade para fazer um trabalho de forma a garantir investimentos no Algarve. Não vale a pena ter ilusões. Precisamos de uma outra dimensão e poderes instalados na região que possam ter dinâmicas para criar riqueza. Só com a regionalização o Algarve poderá sair da crise em que se encontra. Até para praticar desporto, os atletas dos nossos clubes nos jogos fora de casa têm de percorrer trezentos quilómetros em direção a Lisboa. Há cada vez mais maior centralismo no país, não temos mecenas na região e esta passa por sérias dificuldades, sobretudo após ter saído do Objetivo 1 dos fundos comunitários da União Europeia, o que lhe permitia garantir verbas para investimentos. A essa situação juntou-se a falência de muitas empresas num tecido económico já de si frágil.
b. - Como é que o Algarve poderá neste momento inverter essa situação e combater o desemprego?
J.I.M. - A região precisa de um programa de emergência, sobretudo bem calendarizado, e de sabermos o que podemos fazer de imediato, o que será de interesse nacional. É necessário definir qual o modelo de relançamento da economia. Desde logo, temos de fazer uma boa promoção turística e não é estando dependente do Turismo de Portugal ou da forma como esta entidade funciona (que não funciona) que o Algarve poderá cativar novos visitantes. É preciso promover a região a nível internacional. Mas num momento em que destinos turísticos como Turquia e Tunísia, entre outros, até situados na bacia do Mediterrâneo, enchem os mercados emissores de turismo com promoção, Portugal está ausente. O Algarve está ausente. Ao longo de muitos anos, pensou-se que nesta região não teríamos problemas porque «eles, os turistas, vêm ter connosco», como se dizia na altura. Ora, isso gerou um sentimento de comodismo e uma atitude de expetativa. Não uma atitude pró-ativa.
b. - Referiu que o Turismo de Portugal não funciona para cativar novos visitantes. O que se passa? Em que aspetos entende existirem lacunas no seu modo de atuação?
J.I.M. - O Turismo de Portugal enferma muito dessa situação em relação ao país, mas o problema é ainda mais acentuado no tocante ao Algarve. Depois não percebe efetivamente o que está em causa para a promoção desta região. E deveria perceber por uma razão simples: é porque temos sido contribuintes líquidos para o Produto Interno Bruto (PIB) de Portugal, com o turismo do Algarve devido ao número de camas que possuímos e àquilo que conseguimos fazer. Se essa promoção não for feita junto de novos mercados ou dos tradicionais e que gradualmente podem vir a reabilitar e voltar a enviar turistas para o Algarve, será muito difícil ao Algarve poder recuperar a nível económico. Por outro lado, quem quer investir no Algarve enfrenta uma burocracia medonha, que logo provoca desmotivação. Há muitos organismos desconcentrados da administração central, cuja cultura não se alterou, e é preciso compreensão para desbloquear processos naturalmente com respeito pela lei, pelas normas, pelo ambiente, por tudo isso.
b. - Quais são esses organismos?
J.I.M. – Não lhe vou dar exemplos para não ferir suscetibilidades a quem quer que seja. Às vezes os dirigentes desses organismos procuram alterar comportamentos no sentido de respeitar os investidores, mas as máquinas administrativas e técnicas que lá estão têm uma postura totalmente castradora e desrespeitadora.
b. - Como está a referir-se ao sector económico, poder-se-á concluir que um desses organismos é a Direção Regional de Economia?
J.I.M. - Não faço comentários. Posso queixar-me de situações em termos gerais, mas não quero ofender nem o A, nem o B nem o C. Isto é muito dramático. As pessoas têm de perceber que só com atividade económica poderá haver emprego. E só havendo emprego e atividade económica é que o Estado conseguirá receber impostos para assegurar, inclusivamente, os vencimentos dos funcionários públicos, as pensões de reforma, os subsídios sociais e tudo o mais inerente ao Estado Social. Porque o dinheiro não cai do céu. O Algarve encontra-se numa situação muito difícil que irá prolongar-se ainda por mais de cinco anos, no mínimo.
b.- Como assim?
J.I.M. - Ninguém espere que esta crise que o país atravessa se resolva em dois ou três anos. E mesmo a possível recuperação económica já não nos permitirá chegar aos patamares existentes nesta região. Nos próximos anos, é preciso apostar naquilo em que é possível ter uma recuperação mais rápida, ou seja, na promoção turística para vender o que temos. Contudo, o modelo atual está altamente centralizado e opta por promover Lisboa nos mercados internacionais. E essa situação tem permitido o crescimento de Lisboa como destino turístico, acabando o Turismo de Portugal por desprezar o Algarve, que está a trezentos quilómetros de distância. E há uma ideia, inclusivamente em Lisboa, de que no Algarve são todos ricos, o que não corresponde à verdade. Essa mentalidade foi criada há anos devido a um certo esquema especulativo e a um crescimento exacerbado em torno do setor turístico-imobiliário.
b. - A administração central alega que os projetos não avançam muitas vezes por culpa das autarquias. Reconhece responsabilidades a esse nível das câmaras municipais?
J.I.M. - Essa acusação tem sido lançada inclusivamente com a colaboração de alguma comunicação social no país. Mas é preciso frisar que a administração local é de facto o sector da administração mais dinâmico em Portugal. Cometeu erros, é certo. Então, e a administração central também não os cometeu? Então, e os privados não os cometem? O problema é que se lançou essa ideia para destruir o sector da administração local, que de resto já está completamente destruído, com a Lei dos Compromissos e todo o pacote legislativo que leva a um desnorte e que, inclusivamente, os autarcas mais capazes se queiram afastar de tudo isto.
b. - O que é a Lei dos Compromissos e como limita a atividade das autarquias?
J.I.M. - Numa altura em que a crise obriga as câmaras municipais a reduzirem funcionários e a consequente capacidade de atendimento das pessoas, a Lei dos Compromissos ainda agudiza mais esta situação. Porquê? Porque julga que é possível, neste momento, não termos passivo, e, em situação de passivo, não é possível aplicar a Lei dos Compromissos ao obrigar uma autarquia a pagar em 90 dias as dívidas aos seus fornecedores. Compreendo esta norma, que é razoável. Agora o que não é compreensível é que as câmaras precisem de manter os concelhos limpos, os jardins e outros espaços cuidados, e nem sequer tão pouco consigam compartimentar isso nos seus orçamentos porque estão a contar com as dívidas anteriores. Isto é como uma família morrer de fome se não conseguir pagar as suas dívidas. E a Lei dos Compromissos poderá levar ao estrangulamento total da administração local. No caso do Algarve, em particular, até poderá conduzir a uma depauperação completa da qualidade dos espaços urbanos, da limpeza pública e de outros aspetos relacionados com a conservação do ambiente e que, no fundo, devem assegurar a qualidade do produto turístico. Ou seja, quem tiver dívidas já não poderá contratar empresas para esses serviços por falta de fundos disponíveis. Tudo isto é mais um autêntico disparate neste país. Li há dias um artigo num jornal, em que o doutor Fernando Seara, presidente da Câmara Municipal de Sintra, refere que encara com muita dificuldade a sua eventual continuidade como autarca, não neste concelho ao qual já não se poderá recandidatar devido à limitação de mandatos, mas noutro município, e um dos obstáculos por ele apontados é precisamente ser impossível trabalhar com a Lei dos Compromissos. Trata-se, em minha opinião, de um lei que tem a ver com o esquema imobilista.
b. - Mas é preciso haver rigor financeiro nas autarquias…
J.I.M. - Uma coisa é incentivar o rigor, pois houve autarquias que cometeram asneiras no sentido da forma como gastavam o dinheiro. Agora temos de ver que muitos municípios do Algarve estão numa situação em que a quebra de receitas (e a isso a Lei dos Compromissos não atendeu) foi da ordem dos 65 por cento em sede de IMT (Imposto Municipal sobre Transações) e alguns até mais (e aquele era a principal receita), o que limitou por completo a sua atividade. Mais: no caso dos municípios do litoral do Algarve, a própria administração central tem reduzido nalguns casos em 40 por cento as transferências do Orçamento de Estado. Ou seja, há municípios que perdem por via do IMT e do Orçamento de Estado, porque antigamente tinham um IMT elevado. Os municípios do Algarve estão maltratados apesar de serem os responsáveis pelo trabalho desenvolvido no desporto, na cultura, porque os organismos do Estado não o fazem. O Estado está pura e simplesmente ausente da região. As autarquias até vão em socorro das populações em áreas da atuação da administração como a educação, ação social, nas infraestruturas públicas e até na linha costa. Não recebemos dali um cêntimo de quem gere esse espaço, mas são as câmaras que gastam dinheiro a limpar as praias e ainda temos de colocar placas nas arribas a avisar para os riscos existentes. Se não querem autarquias tal como existem pelo menos definamos com clareza o que queremos! Mas só poderá ser feita uma verdadeira reforma administrativa se soubermos o que querem ao nível macro. Não é andar a juntar esta autarquia com aquela e outra. Isso não resolve o problema. Quero saber o que querem das autarquias em termos de desenvolvimento para o país e para assegurar as missões essencialmente no tocante à conservação dos espaços e das respostas às populações e a quem nos visita. Sem isto definido não poderemos ultrapassar esta fase de crise e crescer. Ou seja, estamos muito dependentes quase do divino Espírito Santo… Mas se não houver ação dos homens, não conseguiremos inverter estas situações. É preciso saber qual o modelo de desenvolvimento que se pretende para o Algarve.
A FATACIL tem sido um reflexo da nossa sociedade nos bons momentos. Agora, também neste tempo de recessão, espelha a crise em que vivemos.
Há cada vez mais maior centralismo no país, não temos mecenas na região e esta passa por sérias dificuldades, sobretudo após ter saído do Objetivo 1 dos fundos comunitários da União Europeia, o que lhe permitia garantir verbas para investimentos. A essa situação juntou-se a falência de muitas empresas num tecido económico já de si frágil.
Em meio rural uma pessoa pode instalar um picadeiro, mas já não lhe é permitido construir estábulos para os cavalos, nem que seja para os turistas fazerem passeios, o que é absurdo.
É preciso promover a região a nível internacional. Mas num momento em que destinos turísticos como Turquia e Tunísia, entre outros, até situados na bacia do Mediterrâneo, enchem os mercados emissores de turismo com promoção, Portugal está ausente. O Algarve está ausente. Ao longo de muitos anos, pensou-se que nesta região não teríamos problemas porque “eles, os turistas, vêm ter connosco”, como se dizia na altura. Ora, isso gerou um sentimento de comodismo e uma atitude de expectativa. Não uma atitude pró-ativa.
Quem quer investir no Algarve enfrenta uma burocracia medonha, que logo provoca desmotivação. Há muitos organismos desconcentrados da administração central, cuja cultura não se alterou, e é preciso compreensão para desbloquear processos naturalmente com respeito pela lei, pelas normas, pelo ambiente, por tudo isso.
O modelo atual está altamente centralizado e opta por promover Lisboa nos mercados internacionais. E essa situação tem permitido o crescimento de Lisboa como destino turístico, acabando o Turismo de Portugal por desprezar o Algarve, que está a trezentos quilómetros de distância. E há uma ideia, inclusivamente em Lisboa, de que no Algarve são todos ricos, o que não corresponde à verdade. Essa mentalidade foi criada há anos devido a um certo esquema especulativo e a um crescimento exacerbado em torno do sector turístico-imobiliário.
É muito difícil hoje ser presidente de câmara
Continua «indecisivo» em se recandidatar à presidência da Câmara Municipal de Lagoa, mas tomará uma posição até final deste ano. «Receio que os partidos políticos tenham problemas em encontrar candidatos às eleições autárquicas em 2013», adverte o social-democrata José Inácio Marques, lamentando a «incompreensão» existente no país para com os autarcas e o facto de «tentarem culpabilizá-los por tudo o que acontece de mal». E pergunta qual é o setor da sociedade portuguesa, desde órgãos da administração central até empresas, em que não haja alguém a cometer erros. «Se há erros, então que se sancione quem os cometeu. Agora culpar todos é inadequado e faz com que muitos não se sintam disponíveis para prosseguir a atividade», sublinha o edil algarvio. Admirador de Cavaco Silva, Presidente da República, considera tratar-se de «uma pessoa que também pretendem destruir na sociedade de portuguesa». Nesse sentido, José Inácio Marques afirma que «não quero lançar achas para a fogueira», em jeito de recado subtil para o PSD, de que é um dos vice-presidentes da Distrital de Faro.
b. - Em Janeiro de 2012, em entrevista ao «barlavento», o senhor afirmou que «ainda é cedo para decidir se sou candidato» de novo à presidência da Câmara Municipal de Lagoa, nas eleições a realizar em 2013. Oito meses depois, já tomou alguma decisão ou continua indeciso?
J.I.M. – Continuo indeciso até porque, como referi, há uma série de fatores que não são nada positivos para poderem contribuir para uma decisão de me recandidatar. E receio que os partidos políticos tenham problemas em encontrar candidatos às eleições autárquicas em 2013 precisamente por causa disso. Quem concorre às autarquias, tal como os que se candidatam a deputados, tem de ser respeitado. E isso não aconteceu com o Governo anterior e com este também não está a suceder. Dá a ideia de que somos culpados de tudo e mais alguma coisa. Mas, como já frisei, nós estamos a dar respostas sociais onde o Estado se demitiu de o fazer porque privamos com as pessoas no dia-a-dia.
b. - Mesmo assim, sente-se motivado para ser presidente de câmara?
J.I.M. - É muito difícil hoje ser presidente de câmara devido à incompreensão que existe no país para com os autarcas e tentarem culpabilizá-los por tudo o que acontece de mal. Alguns cometeram erros, é certo. Mas indiquem-me qual é o setor da atividade económica, administrativa, empresarial ou seja qual for, em que não há pessoas que não façam mal? Se há erros, então que se sancione quem os cometeu. Agora culpar todos é inadequado e faz com que muitos não se sintam disponíveis para prosseguir a atividade.
b. - Quando pensa tomar uma decisão para o seu futuro como autarca?
J.I.M. - Terei de tomar uma decisão até ao final deste ano. Mas neste momento nem sabemos como será a lei autárquica. Então, como é que querem que eu decida? Nem sequer se sabe como será o mapa das freguesias, nem sequer se sabe como serão compostos os executivos municipais, não se sabe como irá ser a lei das finanças locais. São treze diplomas que terão de ser aprovados e ninguém sabe seja o que for. Será que chegarão a ser publicados? Portanto, não posso responder neste momento se serei, de novo, candidato à Câmara Municipal de Lagoa porque também há treze questões que coloco a mim próprio. E perante tudo isto, interrogo-me se vale a pena continuar nestas funções. Sou autarca há muitos anos e um dos aspetos que prezo é manter a minha integridade intelectual e moral.
b. - O senhor diz que esta crise está para durar. Mas o primeiro-ministro e líder do seu partido, o PSD, já admitiu que a situação vai melhorar a partir de 2013. Afinal, está pessimista ou é Passos Coelho quem está otimista e não se apercebe da realidade do país?
J.I.M. - Não, não sou pessimista. Uma coisa é melhorar. Se estiver em baixo e melhorar um milímetro que seja, posso dizer que melhorei. Outra coisa é chegar a patamares que sejam capazes de dar resposta às questões essenciais. Atingir patamares neste país em que já estivemos será impossível. Aumentou a conflitualidade entre as pessoas e esse é outro problema que temos nas autarquias.
b. - E de que modo são resolvidos?
J.I.M. - Como em muitas situações tem de haver recurso à justiça e como esta é paga, as pessoas pensam que as câmaras municipais têm poder judicial. Mas não temos. O nosso poder é meramente administrativo. E muitas vezes estamos a servir de bombos da festa, a apanhar tareia da administração central e dos cidadãos. Quando existe conflitualidade entre eles, colocam-nos no meio da situação. As autarquias têm vindo a perder prestígio. E se não houver respeito e autoridade não conseguiremos desenvolver as nossas atividades. Não contem comigo para um esquema abandalhado. Aparecerão sempre pessoas. Mas será o que se pretende? Será o tipo de pessoas de que temos falta? É este tipo de raciocínio que temos de começar a ter no país. Não há insubstituíveis, mas há uns que estão mais bem preparados e outros mais disponíveis para fazer o que deve ser feito.
b. - Como avalia a ação do Presidente da República Cavaco Silva?
J.I.M. - É uma pessoa que também pretendem destruir na sociedade portuguesa.
b. - O próprio PSD está a contribuir para essa situação?
J.I.M. - Como sou pacífico não quero lançar achas para a fogueira. A Presidência da República é a última instância a que podemos recorrer como nação democrática, como prevê a Constituição Portuguesa. E também não podemos destruir o poder local. Cometeram-se erros, mas muitas vezes até foram pressionados por organismos de administração central ao nível de planos de urbanismo. Muitas vezes foram feitas coisas que os autarcas não pretendiam. Quem concorre às autarquias, tal como os que se candidatam a deputados, tem de ser respeitado. E isso não aconteceu com o Governo anterior e com este também não está a suceder. Dá a ideia de que somos culpados de tudo e mais alguma coisa. Mas, como já frisei, nós estamos a dar respostas sociais onde o Estado se demitiu de o fazer porque privamos com as pessoas no dia-a-dia.
16 de Agosto de 2012
Reporter : José Manuel Oliveira
Fotografo : António Alves Fernandes